A primeira vez num Fusca a gente nunca esquece. A minha foi aos 19 anos, na cidade norte-fluminense de Itaocara. Eu estava um pouco nervoso, mas o besouro azul, ano 1975, me mostrou que a vida podia ser boa. Rodadíssimo, tinha câmbio com engates duros e freios cansados. No meio da relação, não consegui disfarçar minha inexperiência. Fui engatar uma quinta, forcei um pouco e... entrou a terceira. Pois é: no calor da hora, nem lembrei que o Volks só tinha quatro marchas — e o motorzinho 1.300 reclamou alto. Foi meu ritual de passagem.
Essa semana, para minha alegria, tive um encontro com um novo Fusca, digamos assim. Mas a similaridade com o carro que me iniciou no mundo da tração traseira fica só no nome.
O carro em questão é uma evolução do New Beetle (1997–2010). Mas para não chamá-lo de “New New Beetle” a Volks resolveu batizá-lo, em cada país, com o apelido local do antigo besouro: na França é Coccinelle, na Itália é Maggiolino e, no Brasil, Fusca mesmo... Assim, pega carona na imagem de um dos carros mais queridos de todos os tempos.
A origem humilde foi esquecida e agora o besouro é sofisticado e caro: R$ 76.600 (manual) e R$ 80.990 (automatizado). O jeito fofinho do New Beetle dos anos 90 deu vez a um visual mais masculinizado. Entraram nessa receita a linha de cintura alta, o para-choque dianteiro esculpido, os faróis com leds e a abolição das lanternas traseiras redondas. Com o para-brisa menos avançado, a silhueta ficou mais próxima à do Fusca “de verdade”.
O carro foi pra academia e ganhou músculos: cresceu 8,4cm na largura e 1,5cm no comprimento, mas diminuiu 1,2cm em altura. E lembra do antigo vaso de flores do New Beetle de 1997? Foi trocado por instrumentos como um cronômetro e manômetros de óleo e do turbocompressor...
Turbo? É isso mesmo. Para apimentar a relação com o novo Fusca, a Volks traz para o Brasil apenas a versão topo de linha do besouro, com o manjado motor 2.0 TSI (do Jetta, do Tiguan e do Passat, também presente nos Audi A3, A4, A5 e TT). Nesta configuração, são 200cv de potência e 28,5kgfm de torque disponíveis já a 1.700rpm...
O primeiro flerte com esse novo Fusca foi em Campinas. Para a viagem até o Rio, recebi um exemplar preto — a cor lembra Almir Rogério cantando “Fuscão pretooo, você é feito de açooo...”, mas é pouco convidativa no calor. Pressiono um botão na chave por três segundos e o Fusca começa a se despir. O teto-solar (opcional por R$ 2.850) e os vidros se abrem por completo. Vamos nessa.
A 60km/h, ouve-se um som delicioso do motor. É um sussurro áspero, que convida à intimidade. Mais força no pedal do acelerador (preso no chão, como mandava vovô Ferdinand Porsche) e meu corpo é comprimido contra o banco. O velocímetro sobe rápido, mostrando que o Fusca está mais rápido do que nunca.
O câmbio robotizado DSG (de seis marchas e duas embreagens) rege a ação. No rodovia Dom Pedro I, em São Paulo, o besouro faz as curvas agarrado ao chão. A suspensão traseira multibraço e os largos pneus 235/45 R18 contribuem.
A suspensão é muito bem acertada: se comporta bem tanto em estrada lisa e numa tocada mais forte, quanto na cidade, onde supera as inúmeras crateras de nossas ruas sem causar desconforto — mesmo com os pneus de perfil baixo.
O modelo agora é fabricado sobre a plataforma do Jetta e do Golf Mk6 (todos são feitos no México), enquanto que, no antecessor, a plataforma era do Golf Mk4.
E vou me tornando mais íntimo do novo Fusca, a começar pela excelente posição de dirigir. Há diversas regulagens para o volante e o banco pode ser colocado em posição baixíssima, privilegiando sua essência esportiva. Além disso, a direção é bem direta.
O volante tem boa pegada, apesar do aro fino em referência (desnecessária) ao modelo clássico. A tampa do porta-luvas e as alças de borracha nas colunas internas são outros pontos que lembram o besouro do passado.
Pena que o novo Fusca seja egoísta. Além de levar apenas quatro passageiros, o banco na minha posição de dirigir deixa menos de um palmo para os joelhos de quem viaja atrás. Se não bastasse sofrer com as pernas, o caimento acentuado do teto também limita o espaço para a cabeça de quem vai no banco traseiro.
Na lista de concorrentes está um carro com igual proposta de resgatar algum charme do passado, cobrando bem caro por isso: o Mini Cooper S (R$ 128.750). Entram ainda os novatos Citroën DS3 (R$ 79.900), e Audi A1 Sport (R$ 109.900).
No fim, cheguei ao Rio sem cansaço e, dias depois, ainda fiz um bate e volta a Vassouras. Deste reencontro de 900km com o Fusca, ficou um pouco de saudade dos tempos em que eu era jovem e o besouro levava seu simples e valente motor refrigerado a ar, montado na traseira. Mas quer saber? Foi melhor agora.
fonte -EXTRA ONLINE
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