terça-feira, 9 de abril de 2013

Livro sobre a tragédia na boate Kiss fala em 'ressurreição' e irrita familiares
Obra do padre Lauro Trevisan (Foto: Reprodução)

RIO - A Associação dos Familiares das Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM) enviou um ofício extrajudicial pedindo que o livro "Kiss - Uma Porta para o Céu" seja tirado de circulação. A obra tem dois trechos considerados incômodos pelas famílias. O livro é de autoria do padre Lauro Trevisan, que disse ter três objetivos ao escrever:
"Confortar os que sofreram e os que continuam sofrendo, levantar o ânimo e a energia da cidade de Santa Maria, e oferecer uma lição para a humanidade, uma lição que ajude a tornar o mundo melhor, mais humano, fraterno e amoroso". A intenção de todo o texto está baseada nisso.


O padre afirmou que muitas pessoas entravam em contato pedindo uma palavra de conforto, e que ele julgou que a melhor maneira de ajudá-las era escrevendo um livro. Mas alguns usuários de redes sociais e familiares das vítimas acusam o padre de aproveitar o sofrimento alheio.

"Claro que ele nunca vai admitir isso, mas ele foi oportunista sim. Usou do momento de dor pra vender o livro", aponta Leo Becker, vice-presidente da AVTSM.
Um dos pontos considerados ofensivos faz menção a jovens que retornaram da morte e estavam vivos no caminhão frigorífico que levava os corpos ao ginásio onde ocorreu o velório. No trecho em questão, ele escreveu: "No auge da balada celestial, o Pai perguntou se alguém queria voltar. Dois ou três disseram que sim e foram encontrados vivos no caminhão frigorífico que transportava os corpos ao Ginásio de Esportes". Inicialmente, levantou-se a hipótese de o padre ter ouvido a história. Porém, ele nega a versão.
"Até a página seis, eu escrevi uma alegoria porque escrevi sobre os que partiram", explica Trevisan.
Para Leo Becker, a passagem poderia levar mães a acreditarem que seus filhos estavam vivos dentro dos caminhões.
"É relativamente muito comum ocorrer o fenômeno do quase morte: a pessoa morre, mas, depois de procedimentos médicos, ela volta e conta o que viu "do outro lado", como um ser iluminado, ou algo assim. Minha intenção era falar disso e não de dizer que tinha gente viva lá dentro", defende-se o padre.
"Os que agonizavam em meio à fumaça funérea"
No ofício enviado à Editora da Mente, responsável pela publicação do livro, a Associação também pede explicações por um trecho da página 11 do livro - fora da parte das alegorias - onde se lê: "num imenso gesto heroico de solidariedade, a salvar os que agonizavam em meio à fumaça funérea".
"As pessoas acharam ofensivo o uso do verbo "agonizar". Expliquei que, no dicionário Houaiss, "agonizar" é "estar prestes a morrer", ou seja, todos agonizam antes da morte. Mas, como não tenho interesse em causar polêmica, e sim de confortar as pessoas, troquei o verbo e tirei o trecho sobre a quase morte - informou Lauro Trevisan.
O padre também rebateu as acusações de oportunismo:
"Tem aqueles que dizem que me aproveitei por ter escrito agora. Então eu pergunto: se você tem uma ferida, você vai esperar um ano para colocar remédio ou vai colocar agora? Se tem depressão, vai esperar seis meses para ir a um médico?"
A primeira edição do livro, com tiragem de 2 mil cópias, esgotou. Segundo Trevisan, a próxima edição, que chega às lojas na quarta-feira, já tem as alterações no texto que, de acordo com ele, não mudam o conteúdo do livro.

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