RISCOS DA AUTOMEDICAÇÃO E REAÇÕES ADVERSAS
A Organização Mundial de Saúde (OMS) tem definido reação adversa a medicamentos (RAM) como: “qualquer efeito prejudicial ou indesejável, não intencional, que aparece após a administração de um medicamento em doses normalmente utilizadas no homem para a profilaxia, o diagnóstico e o tratamento de uma enfermidade.”
No Brasil, embora haja regulamentação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) para a venda e propaganda de medicamentos que possam ser adquiridos sem prescrição médica, não há regulamentação nem orientação para aqueles que os utilizam. O fato de se poder adquirir um medicamento sem prescrição não permite o indivíduo fazer uso indevido do mesmo, isto é, usá-lo por indicação própria, na dose que lhe convém e na hora que achar conveniente.
A automedicação é uma prática bastante difundida não apenas no Brasil, mas também em outros países. Em alguns países, com sistema de saúde pouco estruturado, a ida à farmácia representa a primeira opção procurada para resolver um problema de saúde, e a maior parte dos medicamentos consumidos pela população é vendida sem receita médica (como analgésicos e antitérmicos), isentos de prescrição médica (MIP’S).
As razões pelas quais as pessoas se automedicam são inúmeras. A propaganda desenfreada e massiva de determinados medicamentos contrasta com as tímidas campanhas que tentam esclarecer os perigos da automedicação. A dificuldade e o custo de se conseguir uma opinião médica, a limitação do poder prescritivo, restrito a poucos profissionais de saúde, o desespero e a angústia desencadeados por sintomas ou pela possibilidade de se adquirir uma doença, informações sobre medicamentos obtidos à boca pequena, na internet ou em outros meios de comunicação, a falta de regulamentação e fiscalização daqueles que vendem e a falta de programas educativos sobre os efeitos muitas vezes irreparáveis da automedicação, são alguns dos motivos que levam as pessoas a utilizarem medicamento mais próximo.
A associação de saúde como uso de medicamentos faz com que os pacientes abusem das drogas. Os profissionais da área de saúde devem orientar os pacientes e os seus familiares no sentido de evitar os abusos dos medicamentos (“overuse”) pelos eventos adversos. Com o fator limitante do tempo, há uma deterioração nas consultas médicas e “não fazer” consome mais tempo que “fazer”, isto é, não solicitar exames nem prescrever medicamentos de validade duvidosa obriga ao médico um esclarecimento a respeito da conduta expectante.
As plantas medicinais têm lugar garantido no “folclore” brasileiro. Quem não conhece a babosa, chá de quebra pedra, pata de vaca, chá de picão e extratos de outras numerosas plantas? O efeito da maioria delas é desprovido de qualquer comprovação científica (evidências) e a sua manipulação por leigos pode comprometer a qualidade. Pretensiosamente pleiteiam uma vaga na chamada medicina alternativa com uso de “produtos naturais” (ou terapia não convencional).
Considerando-se que as doenças psicossomáticas têm grande prevalência, permite-se até admitir que as chances de erro ao trilhar por este comportamento são pequenas, alegando-se que os produtos disponibilizados, em sua maioria, não oferece grandes riscos. Contudo, os riscos existem e devem ser considerados. Produtos sem o devido controle de qualidade como prosaicos cosméticos aplicados sobre o couro cabeludo mostraram efeito teratogênico, devido à contaminação por chumbo. O uso tópico não é isento de efeitos indesejáveis. Cremes “rejuvenescedores”, muito populares, podem causá-los, além de quase nunca cumprirem o prometido.
O uso das Isoflavonas é um exemplo atual da indicação imprópria e exagerada de agentes ditos “homeopáticos” ou “naturais”. A partir de estudos que mostram uma menor sintomatologia de climatério em mulheres asiáticas atribuída ao consumo de soja, muitas mulheres começaram a utilizar comprimidos de soja sem controle de qualidade e sem supervisão médica. O uso indevido de Isoflavonas, manipuladas de maneira no mínimo descontrolada, tem causado efeitos colaterais importantes, aumento do Colesterol e dos Triglicérides e alterações discrásicas sanguíneas, como diminuição das hemácias e consequentes anemias.
Além disso, recentes estudos mostram que uma série de substâncias ditas “inocentes”, como Cremes de Ginseng, têm ação proliferativa endometrial, podendo levar a quadros hiperplásicos que algumas vezes podem representar lesões precursoras de adenocarcinoma (câncer).
Recentemente o Misoprostol, de uso muito comum entre as mulheres brasileiras para a prática abortiva, chamou a atenção da comunidade científica internacional desde que se observou associar-se a malformações como a Síndrome de Möbius (malformação crânio-facial) e malformações de membros. Estas foram observadas nos filhos de pacientes que tiveram o abortamento frustrado com a utilização desta droga. Além dessas anormalidades, em um estudo colaborativo latino-americano de 4673 casos de malformações fetais (4980 controles), outras malformações foram atribuídas ao uso do Misoprostol: hidrocefalia e extrofia de bexiga (fica exposta fora do abdômen).
A automedicação pode mascarar diagnósticos na fase inicial da doença. Exemplo marcante é no diagnóstico de apendicite aguda. O doente inicia com um quadro leve se automedica com antibióticos. Como consequência a apendicite aguda em fase inicial, que se resolveria com uma cirurgia tecnicamente fácil, pode evoluir para um quadro de peritonite grave com consequências às vezes fatais.
Do mesmo modo, neoplasias gástricas e intestinais (cânceres) podem ter diagnósticos mascarados e retardados pela melhora de sintomas promovida por bloqueadores de bomba de próton ou outros medicamentos que agem no tubo digestivo.
Outro exemplo relevante é o uso abusivo de antibióticos, sem qualquer critério. Além de comumente ser desprovido de eficácia, pode facilitar o aparecimento de microorganismos resistentes, com óbvias repercussões clínicas e prognósticas.
Portanto há que se louvar a atitude e o discernimento do Ministério da Saúde em decretar o controle de inúmeras drogas seguramente teratogênicas como Talidomida, Isotretinoína e diversos Quimioterápicos.
O problema é universal, antigo e de grandes proporções. A automedicação pode ser considerada uma forma de não adesão às orientações médicas e de saúde. Nesse sentido, Hipócrates já sentenciou: “Toda vez que um indivíduo diz que segue exatamente o que eu peço, está mentindo“. Não há como acabar com a automedicação, talvez pela própria condição humana de testar e arriscar decisões. Há, contudo, meios para minimizá-la, como a orientação dos profissionais farmacêuticos para a população em geral, além do estímulo à fiscalização apropriada que são fundamentais nessa situação.
“Adaptado”
Rosemarie Pereira Ramos - Farmacêutica-Bioquímica
fonte:Maratimba.com
fonte:Maratimba.com
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